Comportamento Antissocial nos Condomínios – Perturbação do Sossego – Aplicação de Multa
1. Introdução
O “comportamento antissocial do condômino” se apresenta pelas mais variadas formas. Em sentido amplo, toda conduta que afronte regras disciplinadoras do convívio no condomínio se caracteriza como antissocial. Entretanto, neste breve trabalho, nos ateremos ao comportamento que atinge o sossego, como por exemplo, ruídos excessivos, música em volume elevado, festas dentro do apartamento, manutenção de animais, e outras situações assemelhadas que causam o mesmo tipo de perturbação.
Atualmente podemos notar que a grande maioria dos empreendimentos imobiliários verticais são edificados com plantas que prestigiam terraços espaçosos. Quanto maior a metragem da unidade, maior tem sido o espaço destinado ao terraço.
Consequentemente, muitos condôminos estão dando preferência a um maior uso dos terraços, principalmente para a realização de festas, churrascos com amigos, dentre várias outras finalidades. Assim, o que antes se fazia com mais frequência nos salões de festas e churrasqueiras coletivas, passou-se a fazer dentro do próprio apartamento.
Normalmente, trazendo as festas e outros eventos para dentro do apartamento, na maioria das vezes as pessoas preferem se acomodar no amplo terraço, o que, por via de consequência, acarreta maior propagação dos ruídos decorrentes de conversas em voz alta, risadas, músicas em volume mais elevado do que o normal, etc.
Isto, inevitavelmente, fará com que vizinhos mais próximos da unidade em que se está realizando a festa, ainda que noutra torre, sintam-se incomodados, perdendo o sossego no próprio lar. Até aí, não há muito que se fazer, haja vista que ao se adquirir esse tipo de imóvel deve-se ter em mente a possibilidade de, uma vez ou outra, algum vizinho organizar um evento em casa que traga ruídos além do que se está acostumado.
O que não se pode admitir, entretanto, é o exercício abusivo do direito pelo condômino, de modo a prejudicar o sossego dos demais condôminos, o que pode, além de implicar efeitos na salubridade, afetar a segurança. Assim, quando um condômino passar a realizar esses eventos no próprio apartamento com muita frequência, ou mesmo sem esse qualquer tipo de evento, passa a se comportar de forma anormal (ouvir som em volume muito elevado, abusar da potência de seu equipamento de hometheater, utilizar objetos ou equipamentos que podem causar incômodos a vizinhos, arrastar móveis ou objetos, não evitar que seu animal de estimação exceda nos ruídos, etc.) inobservando os horários de descanso, algo deve ser feito para que isso não se torne uma conduta rotineira.
Normalmente, o causador do incômodo alega que está no seu direito, haja vista estar dentro de sua própria residência; há quem confunda o direito de propriedade, achando que isto lhes permite utilizar seu apartamento como bem entenderem, sem terem que se preocupar com terceiros. O condômino incomodado, por sua vez, também terá muitos outros argumentos que embasarão seu entendimento de estar sendo prejudicado, mas isto também não significa que pode exigir a aplicação de multas por qualquer motivo.
Neste modesto trabalho, faremos algumas observações sobre tão vasto tema, para tentar demonstrar, ainda que de forma singela, até onde vão esses direitos, e quando o condômino incomodado pode reclamar e exigir providências do síndico.
2. Deveres do síndico
Apenas para facilitar o que será exposto adiante, mostra-se oportuno apresentarmos as atribuições legalmente impostas ao síndico.
A Lei nº 4.591/1964, em seu artigo 22, § 1º, estabelecia as atribuições do síndico no exercício de sua função:
“Art. 22. (...)
§ 1º Compete ao síndico:
a) representar ativa e passivamente, o condomínio, em juízo ou fora dêle, e praticar os atos de defesa dos interêsses comuns, nos limites das atribuições conferidas por esta Lei ou pela Convenção;
b) exercer a administração interna da edificação ou do conjunto de edificações, no que respeita à sua vigência, moralidade e segurança, bem como aos serviços que interessam a todos os moradores;
c) praticar os atos que lhe atribuírem as leis a Convenção e o Regimento Interno;
d) impor as multas estabelecidas na Lei, na Convenção ou no Regimento Interno;
e) cumprir e fazer cumprir a Convenção e o Regimento Interno, bem como executar e fazer executar as deliberações da assembléia;
f) prestar contas à assembléia dos condôminos.
g) manter guardada durante o prazo de cinco anos para eventuais necessidade de verificação contábil, toda a documentação relativa ao condomínio.
(...)”
Atualmente, o artigo 1.348 do Código Civil dispõe que:
“Art. 1.348. Compete ao síndico:
I - convocar a assembléia dos condôminos;
II - representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns;
III - dar imediato conhecimento à assembléia da existência de procedimento judicial ou administrativo, de interesse do condomínio;
IV - cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembléia;
V - diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores;
VI - elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano;
VII - cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas;
VIII - prestar contas à assembléia, anualmente e quando exigidas;
IX - realizar o seguro da edificação.”
Ao síndico, portanto, dentre suas várias funções, compete impor e cobrar multas pela inobservância das regras que disciplinam o convívio no condomínio.
Se o síndico não estiver desempenhando suas atribuições como deve, ou não fizer a devida prestação de contas, poderá ser destituído do cargo através de assembleia convocada por pelo menos um quarto dos condôminos (art. 1.355, CC), sendo necessários os votos da maioria absoluta (50% + 1 dos presentes), tal como exige o artigo 1.349 do Código Civil. O Ideal, para este tipo de assembleia, é que seja ela convocada com apenas dois objetivo: 1) a votação para destituição do síndico em exercício; e, 2) a eleição do novo síndico.
Feitas estas breves observações, mister se faz analisarmos os deveres dos condôminos e a aplicabilidade das multas por conduta antissocial.
3. Deveres dos condôminos e a aplicação de multas
O artigo 19 da Lei nº 4.591/1964, garantia ao condômino o direito de usar e fruir com exclusividade de sua unidade. Entretanto, não como bem entendesse, pois já não se permitia prejudicar os demais. Vejamos:
“Art. 19. Cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interêsses, condicionados, umas e outros às normas de boa vizinhança, e poderá usar as partes e coisas comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos ou moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos.”
O Código Civil, por seu turno, em seu artigo 1336, inciso IV, impõe ao condômino o dever de “dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes”:
“Art. 1.336. São deveres do condômino:
(...)
IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.
(...)
§ 2º. O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembléia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.”
A simples leitura do artigo 1.336, IV, por si só, é mais do que suficiente para deixar claro que o fato de o condômino ter o direito exclusivo de usar e fruir de seu apartamento não significa que pode agir como bem entender, sem ter que se preocupar com os demais condôminos. É inequívoco, na verdade, que o condômino tem a obrigação de exercer seus direitos de modo a não prejudicar os demais no que se refere ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou bons costumes.
Certamente esses deveres, além de estarem expressos na lei, estarão nas regras que disciplinam o condomínio.
Desta forma, se inobservados tais deveres pelo condômino, poderá o síndico, independentemente da deliberação em assembleia, aplicar a multa prevista na convenção do condomínio.
A aplicação de multa decorrente desse tipo de infração só dependerá da deliberação em assembleia a que se refere o § 2º do artigo 1.336 do Código Civil na hipótese de a referida multa não estar prevista na convenção do condomínio. Esta penalidade não poderá ultrapassar cinco vezes o valor da contribuição mensal ao condomínio.
É importante enfatizarmos que esta multa, dentre outros casos expressos, é de aplicação específica para os casos de perturbação sossego, salubridade, bons costumes e segurança dos possuidores (art. 1336, §2º, CC). Esta ressalva é importante pelo fato de que há outro tipo de multa que também é aplicável em razão de comportamento antissocial, sendo que esta outra encontra-se prevista, de forma mais genérica, no artigo 1.337 do Código Civil.
É importante destacarmos que embora haja duas multas previstas para os casos de comportamentos antissociais (art. 1336, § 2º; e art. 1337, CC), os requisitos para a aplicação das mesmas não se confundem, já que essas penalidades são estabelecidas para situações distintas. Ou seja, para a aplicação da multa do artigo 1.336, § 2º, do Código Civil não é necessário atender aos requisitos exigidos para se aplicar a multa do artigo 1.337.
Como dissemos na introdução deste breve artigo, o comportamento antissocial pode existir de várias formas, mas em alguns casos estará sujeito apenas à penalidade do artigo 1.336, § 2º, do Código Civil, e noutras situações aplicar-se-á apena a multa do artigo 1.337, do mesmo diploma legal.
Para melhor demonstrarmos as diferenças, convém a leitura do artigo 1.337, do Código Civil:
“Art. 1337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.
Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembléia.”
Note-se que o artigo 1.337 do Código Civil é bastante genérico ao dizer que a multa pode ser aplicada quando houver descumprimento reiterado de deveres perante o condomínio.
O legislador procurou, com essa expressão de amplo alcance, abraçar todas as condutas indevidas que não estivessem com previsão de penalidade prevista expressamente noutros dispositivos legais. Para bem ilustrarmos o que se expõe, as infrações a que se referem, por exemplo, os incisos II, III e IV do artigo 1.336, do Código Civil, estão sujeitas à penalidade do § 2º do mesmo artigo, mas não à multa do artigo 1.337, haja vista sua previsão expressa.
Entretanto, caso a conduta antissocial punida pela multa do § 2º do artigo 1.336 torne-se de prática reiterada pelo condômino infrator, nada impede que seja ele punido de maneira mais severa, podendo-se utilizar a penalização na forma estabelecida pelo parágrafo único do artigo 1.337 do Código Civil. Esta sistemática também se aplica se houver reiterada violação dos deveres do artigo 1.336, II a IV do Código Civil.
Como já se manifestou o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
“O artigo 1336 trata da punição aplicada diretamente pelo síndico, quando a infração e respectiva sanção estejam previstas, ainda que genericamente, na Convenção de Condomínio. Inexistindo prévia tipificação, a assembléia poderá impor a punição, procedendo conforme determinado na parte final do parágrafo 2o do art. 1336.
Com essas diretrizes o Código Civil ratificou a possibilidade de o condomínio, representado pelo síndico, apenar pecuniariamente o condômino infrator dos deveres patrimoniais, limitando, todavia, o valor da multa ao quíntuplo das contribuições mensais. Por coerência lógica, dessa previsão decorre que a cada infração pode corresponder uma sanção, desde que cada multa, individualmente considerada, não ultrapasse o máximo legal.
Já o art. 1.337 trouxe importante inovação ao possibilitar que a punição não se restrinja à multa por cada conduta individualizada, possibilitando que o condômino infrator tenha de se sujeitar a severas penalidades em razão da reiteração das infrações, observado, nesse contexto, o procedimento mencionado na lei e a
legitimidade exclusiva da Assembléia Geral para deliberar e impor a pena.
Nada impede que haja a imposição de multas diretamente pelo síndico, nos termos do 2o do art. 1336, e cumulativamente a aplicação da multa prevista no art. 1337, desde que a reiteração seja patente e sempre respeitado o direito de defesa.
O parágrafo único do art. 1337 corrobora essa regulamentação ao evidenciar verdadeira gradação das penalidades. O dispositivo possibilita que, diante da insistência de um condômino em infringir regras da boa-vizinhança, evidenciando, com suas atitudes, reiterado comportamento antissocial, a ponto de gerar verdadeira "incompatibilidade de convivência", sofra nova e severa multa, cujo limite poderá alcançar valor equivalente a até o décuplo do valor das contribuições condominiais.”
(TJ/SP – 30ª C. Dir. Priv., Apel. s/ Rev; nº 992.06.013289-1, Rel. Des. Edgard Rosa, julg. 21.07.2010)
Para evitar que a multa do art. 1337 do Código Civil fosse empregada pelo síndico com facilidade, exige-se que somente a conduta antissocial reiterada pode ser penalizada por essa penalidade. Noutras palavras, não é pelo fato de que um condômino desrespeitou um de seus deveres (distintos do artigo 1.336, II a IV, CC) uma única vez, que poderá ele já ser multado. Necessário será que o condômino infrator, comporte-se de forma antissocial com maior frequência, de modo a caracterizar o descumprimento de reiterado de seus deveres. Nesse sentido:
“DESPESAS DE CONDOMÍNIO – COBRANÇA – MULTA – COMPORTAMENTO ANTI-SOCIAL – FATO ÚNICO – REQUISITO DA REITERAÇÃO – NÃO COMPROVAÇÃO – ART. 1.337 CC/2002 – APLICAÇÃO DA MULTA AFASTADA.
A multa prevista no art. 1.337 do CC/2002 exige que o comportamento do comdômino anti-social seja reiterado de modo que tratando-se de fato isolado incabível a cobrança da referida multa, que depende, ainda, de deliberação em assembléia. Recurso improvido”
(2º TAC/SP – 3ª C., Ap. s/ Rev. nº 854263-0/7, Rel. Des. Carlos Giarusso Santos, julg. 03.08.2004)
“APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA DE MULTA CONDOMINIAL. COMPORTAMENTO ANTI-SOCIAL. REINCIDÊNCIA. ARTIGO 1.337, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL. ADEQUAÇÃO DO VALOR.
Aplica-se multa ao “condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores”. O valor de tal penalidade, contudo, deve, além de observar o limite imposto pelo artigo 1.337, parágrafo único, do Código Civil, refletir a realidade social e condominial.
Recurso não-provido.”
(TJ/RS – 17ª C. Cív., Ap. Cív. nº 70011885472, Rel. Des. Alzir Felippe Schmitz, julg. 09.03.2006)
“Condomínio - Aplicação de multa, com fundamento no § único do art. 1337 do CC - Caso em que não houve a reiteração da conduta anti-social, mas apenas um fato isolado, sendo a autora responsabilizada pelos prejuízos que causou em ação reparatória - Multa indevida – Recurso improvido.”
(TJ/SP – 9ª C. Dir. Priv., Ap. nº 405.942-4/9-00, Rel. Des. José Luiz Gavião de Almeida, julg. 13.04.2010)
Desta forma, se a conduta antissocial do condômino infrator não é um fato único, ele poderá ser multado em valor correspondente a até cinco vezes o valor da taxa condominial, nos termos do artigo 1.337 do Código Civil. Se mesmo após a aplicação dessa penalidade o condômino infrator insistir na conduta antissocial, a multa poderá chegar a dez vezes o valor da contribuição para despesas do condomínio.
Do art. 1.337 do Código Civil verifica-se que para a aplicação da multa exige-se, além da reiteração da conduta, que haja a deliberação por três quartos dos demais condôminos, ou seja, o síndico não pode aplicar a multa por si só.
Apesar da intenção do legislador de não permitir que a multa fosse utilizada em favor do condômino chato, que pede sua aplicação por qualquer motivo, acabou por dificultar sua aplicação, o que favorece as pessoas que abusam dos seus direitos.
A aplicação da multa prevista no artigo 1.337 do Código Civil depende de dois requisitos: a) que a conduta antissocial seja de prática reiterada; e, b) que a multa tenha sido aplicada com deliberação de três quartos dos demais condôminos. Nesse sentido:
“Despesas de condomínio. Cobrança. Ação julgada procedente. Apelo argumentando que a multa prevista no artigo 1.337 do atual CC não é devida. Alegação de que não há conduta reiterada do apelante. Confirmação da condenação. A regra do artigo 1.337 do CC impõe duas condições para a aplicação da multa: a reiteração de atitude danosa à massa condominial e que a deliberação seja tomada por quórum específico de ¾ dos votos dos demais condôminos, o que foi observado. No caso, está caracterizada a conduta reiterada de inadimplência do requerido, vez que deixou de pagar as quotas condominiais referentes a três meses, no mínimo. Recurso não provido”
(TJ/SP – 35ª C. Dir. Priv., Apel. Cív. nº 0036905-36.2008.8.26.0224, Rel. Des. Manoel Justino Bezerra Filho, Julg. 04.07.2011)
Para complicar ainda mais a utilização da multa do artigo 1.337 do Código Civil como força desmotivadora de abusos, há quem entenda que antes da sua aplicação deve ser dada a oportunidade de o condômino infrator se defender. Assim já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo:
“Para impor multa a condômino por reiterado comportamento antissocial exige-se, do síndico, notificação com descrição objetiva do fato ou dos fatos a que corresponda ou correspondam cada comportamento nocivo, além de prazo razoável para defesa. Exige-se, mais, ‘ulterior deliberação da assembléia’ com quórum ‘de três quartos dos condôminos restantes’. Ausentes tais requisitos formais, anula-se a sanção imposta, repelindo-se, antes, as preliminares.”
(TJ/SP – 8ª C. Dir. Priv., Ap. Cív. n.º 0.280.101-94.2010.8.26.0000, Rel. Des. Celso Pimentel, Julg 14.12.2010).
Nos parece, com a devida vênia, que a legislação não exige a oportunidade de defesa para aplicação da multa decorrente de infrações às regras do condomínio. A Constituição Federal, ao assegurar o direito à ampla defesa (art. 5º, LV), é expressa ao dispor que o contraditório e a ampla defesa é assegurada “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral”. Ou seja, o direito de defesa é constitucionalmente garantido apenas em processos judiciais ou procedimentos da administração pública; e não na esfera privada, como é o caso dos condomínios. Essa oportunidade de defesa só será obrigatória se prevista nas regras do condomínio, nunca por força de lei.
Na realidade, entendemos que a mera deliberação pelos demais condôminos sobre a aplicação da multa já é suficiente para o exercício do contraditório e da ampla defesa. Isto porque, na data da assembleia em que se deliberará sobre a aplicação da multa, o condômino infrator poderá apresentar seus argumentos de defesa, o que será apreciado pelos condôminos antes de decidirem se é ou não o caso de multa.
4. Conclusões
Do presente trabalho, apesar de sua simplicidade, é possível concluirmos:
a) Comportamento antissocial, em linhas gerais, é toda e qualquer conduta que se mostre contrária aos interesse dos demais condôminos.
b) A lei impõe ao síndico as funções que deve desempenhar fielmente, prestando as devidas contas. Caso o síndico não se desincumba de suas atribuições como imposto pela lei, poderá ser destituído do cargo, com a eleição de outra pessoa para sua substituição.
c) Aos condôminos são assegurados inúmeros direitos, os quais devem ser exercidos sem prejudicar aos demais, o que ocorrendo, autoriza a aplicação de multas tal como previstas em lei e nas normas que regem o condomínio.
d) O condômino que usa ou frui de sua unidade perturbando o sossego dos demais pode ser multado diretamente pelo síndico, independentemente de deliberação em assembleia, caso a penalidade esteja prevista, ainda que genericamente, pelas normas do condomínio. A deliberação só será necessária caso a multa não tenha previsão nas regras que disciplinam as relações no condomínio.
e) A multa do artigo 1.336, § 2º, do Código Civil pode ser aplicada quantas vezes forem as violações cometidas pelo condômino infrator, e se essa conduta antissocial tornar-se reiterada, poder-se-á fazer uso da majoração do valor dessa multa, nos termos do parágrafo único do artigo 1.337, do Código Civil.
f) A aplicação da penalidade do § 2º do artigo 1.336 do Código Civil não exige a reiteração das condutas antissociais, bastando uma única infração devidamente constatada.
CARLOS ALBERTO DEL PAPA ROSSI
Advogado, consultor em negócios imobiliários, pós-graduado em Direito Tributário (PUC/SP), pós-graduado em Direito Processual Civil (PUC/SP), MBA com ênfase em Direito Empresarial (FGV/SP), Extensão Universitária em Direito Imobiliário (FMU), autor do livro “Introdução ao Estudo das Taxas” e de artigos publicados em revistas especializadas.